Viajando ao Japão dos samurai!
Escrito por: Leonardo Nicolin
Primeiro, antes de começar a criticar esse novo mangá, digo a nova organização das “REVIEWS” no Analyse It, teremos três quadros: “Primeiras Impressões”, que serão referentes aos três primeiros capítulos da uma série. “Crítica”, que será referente à um arco específico ou a uma série com mais de 1 volume (no caso a crítica será dividida por volume). E “Vale a Pena Ler” será um artigo muito específico, extremamente estruturado, sem voto, que serve para dizer se vale a pena ler aquela série
E nada melhor do que começar esse “ROUND” de novas séries com “Nige Jouzu no Wakagimi” (The Elusive Samurai), novo mangá de Yuusei Matsui, autor de Neuro e de Ansatsu Kyoushitsu, que completou 1 volume na semana passada. A série chegou na revista com um grande “hype”, já que muitos esperavam ver o retorno de um dos autores mais promissores da revista, mas será que a sua nova série conseguiu entregar capítulos de qualidade? Ou é mais um veterano que entrega uma série medíocre e destinada ao fracasso?
“Uma aventura no Período Muromachi”
Para termos uma resposta para essas duas perguntas, temos antes de tudo que avaliar a proposta do mangá: Nige Jouzu no Wakagimi, conta a história de Hojo Toriyuki, um garoto que se tornará um dos líderes do “Shogunato”, porém Toriyuki, não é um verdadeiro guerreiro. A sua única real habilidade é escapar e se camuflar; não sabe brandir uma espada, não sabe lutar corporalmente e sua força física é realmente muito reduzida.
A sua fraqueza em combates, contudo, nunca o preocupou. Sabendo que tem vários soldados a sua disposição, sempre acreditou que nunca teria que utilizar da sua própria espada para derrotar os inimigos. Tudo acaba mudando, quando um dos principais generais do seu governo, Ashikaga Takauji, decide realizar um golpe de estado – matando toda a dinastia Hojo e conquistando o poder para si mesmo – Toriyuki acaba se tornando o único sobrevivente da sua família, e com a ajuda de um “sensitivo”, tentará recuperar o trono que é seu de direito.
A velha história da “coroa usurpada” é sempre interessante, pois é uma base tanto da história (já que é algo que aconteceu em todos os continentes) quanto da literatura, que tende a fantasiar essa história, dando o protagonismo para o príncipe usurpado. E “Nige Jouzu no Wakigimi” não é muito diferente; É também uma narração que pesca diretamente da realidade histórica para criar uma versão romântica e fantasiosa desse fato.
Tanto Hojo Toriyuki quanto Ashikaga Takauji existiram: Inclusive, Takauji foi o primeiro shogun da linha de Shogunato comandadas pela família Ashikaga, responsável ao “Período Muromachi” (1336 – 1573). O Shogun foi realmente responsável por um dos principais golpes militares da história do Japão. Entretanto, como vocês podem perceber pela duração do período Muromachi, o nosso protagonista não conseguiu, no mundo real, reaver o poder, porém, o mangá Nige Jouzu no Wakagimi parece querer contar uma história diferente, modificar essa realidade. Vemos, deste modo, o protagonista se preparando para recuperar o seu reino.
E devo assumir que ver um mangá semi-histórico na revista me chamou atenção, principalmente conhecendo a capacidade do Matsui em desenvolver as suas histórias. O meu interesse, porém, não superou o terceiro capítulo da série, por causa das constantes problemáticas que sua narrativa e seu enquadramento tiveram.
“O jovem nobre mangá parecia sem determinação” (Capítulo 1)
A obra sofre de três grandes problemas estruturais: Narração desinteressante, personagens não-carismáticos e enquadramento caótico. Comentando o primeiro ponto (a narração), que na minha opinião é o defeito mais grave, a série até entrega dois primeiros capítulos de boa qualidade, bem articulados. O primeiro capítulo, mesmo tendo alguns pulos temporais confusos, consegue apresentar bem o universo. E o segundo, ajuda o leitor a criar cada vez mais empatia com o protagonista, já que entrega mais tragédias familiares ao protagonista.
Entretanto, a partir do terceiro capítulo, o autor entra em uma espiral de capítulos fracos, desinteressantes… Sem determinação! O leitor, curioso pela situação histórica e política que o mangá se encontra, quer ver mais da organização cultural e militar do Período Muromachi, mas não é isso que o Matsui entrega: Vemos uma sequência de capítulos com inimigos muito mal desenvolvidos, tensões inexistentes e escolhas narrativas que não acrescentam em NADA na evolução da história.
São uma sequência de capítulos que deixam o leitor totalmente perdido, pois não levam realmente a lugar nenhum. Sim, o objetivo desses capítulos é bem óbvio: Desenvolver tanto o protagonista quanto os personagens secundários (que, aliás, não lembro o nome de nenhum), todavia, o que vemos são estratégias narrativas vazias, que resultam em um desenvolvimento superficial e uma progressão vaga.
Utilizando como exemplo o quarto capítulo, que é centrado justamente em desenvolver o alto sacerdote, personagem que deveria servir tanto como um guia para os leitores quanto como um grande elemento cômico: É uma estranha mistura de Neuro e Koro-Sensei. Por isso, um personagem ESSENCIAL para o roteiro, que depende que os leitores criem uma simpatia pelas suas piadas, pela sua personalidade e pela sua função.
Seria essencial deste modo que suas cenas funcionassem como planejado, mas não, Matsui se propõe a apresentar cenas semi-épicas (O grande jardim e o público enlouquecido pelo “espetáculo” entregue) para dar uma ideia de grandiosidade ao sacerdote, mas vários erros na estruturação de todo o capítulo, faz com que nenhuma das cenas apresentadas tivessem o efeito desejado.
As continuas piadas mal articuladas quebram completamente a tensão que o autor se propõe entregar, e acreditem, não tem nada pior em uma série Shounen que uma piada FORÇADA e totalmente descabida. Deste modo, toda a apresentação da real função do personagem quanto o desenvolvimento para demonstrar quanto grandioso é o seu poder, acaba se perdendo nas suas piadas falhas, suas expressões bocó e seus discursos frívolos. Assim, o leitor, quando chega nas últimas páginas, que seriam o ápice do quarto capítulo, não sente nada, no máximo, sente um tédio absurdo.
Os capítulos 5 e 6 também sofrem de problemas parecidos, a incapacidade do Matsui em entregar um cenário de tensão real, prejudica tanto o prazer em ler o capítulo quanto também o bom desenvolvimento dos personagens secundários: Vemos que os ajudantes serão essenciais para o crescimento do herói da história, mas, não conseguimos mesmo assim se importar com eles. Pois não demonstram nenhuma personalidade.
“Corra deste mangá, como o protagonista corre dos inimigos”
Toda essa sequência de capítulos seria muito mais interessantes se o autor escolhesse a boa e velha “Jornada do Herói”, no qual o Hojo Toriyuki, juntamente com seus súditos, tivesse que atravessar escondido todo reino, até alcançar o templo do sacerdote, onde receberia um treinamento: Nessa sequência de capítulos que poderia ir do quarto até o oitavo, os personagens seriam obrigados a se esconder das trupas inimigas, matar (no meio de uma chuva fria) alguns javalis ferozes para se alimentar, entrar escondidos em uma vila destruída para buscar referimentos, até quando alcançassem o tempo. O Sacerdote por um motivo desconhecido (no caso, seria para testar Toriyuki) o abandona após o terceiro capítulo, dando somente um mapa.
Essa sequência, por exemplo, ajudaria o autor a desenvolver quanto o Japão estava destruído por causa do golpe militar, a mostrar as habilidades de correr e se esconder do Toriyuki, a criar um “arco de amadurecimento” do príncipe, ajudaria também a uni-lo aos seus súditos (já que estavam passando JUNTOS por um momento de extrema dificuldade) e daria uma carga dramática, que com bons momentos de comédia, que deixariam os leitores presos ao mangá. Sim, o sacerdote deveria estar ausente nesses capítulos, contudo, a partir do oitavo ou nono capítulo, voltaria a ser um elemento importante.
Se o “arco principal” é um trem descarrilhado que não está levando a lugar nenhum, quando o autor (raramente) decide desenvolver a questão histórica, o mangá dá um bom respiro de esperança: Ver o vilão principal realizando um golpe de estado, ver como esse golpe trouxe pobreza e mortes, causam uma aflição ao leitor que o estimula a TORCER para que o protagonista volte ao trono e dê a sua população a paz que merece. São esses momentos que eu conseguia perceber que Nige Jouzu no Wakagimi realmente poderia se tornar uma série de qualidade.
Aliás, o poder utilizado pelo protagonista (de escapar) também poderia ser um grande ponto forte da série: Matsui entrega, no primeiro capítulo, um quadro duplo lindíssimo que mostra muito bem o potencial que essa habilidade tem, mas, os capítulos seguintes meios que transformam essa habilidade em algo bem tedioso (e os lindos quadros dos dois primeiros capítulos, se tornam quadros confusos, no qual o leitor tem uma real dificuldade em entender o que está acontecendo).
Falando em quadros, mesmo o Matsui tendo um estranho problema em entregar quadros bem estruturados, que facilitam a leitura, não podemos dizer que Nige Jouzu no Wakagimi tem artes ruins: É instável, mas não ruim. Nas poucas páginas duplas presentes, três em sete capítulos, vemos o grande talento do autor que já desenhou duas séries de sucesso. A sua arte brilha principalmente quando a questão é desenhar os olhos dos personagens, cenas violentas e expressões de raiva, que lembram os deuses japoneses. Uma pena que o autor prefere adotar páginas simples, com muitos enquadramentos sobrepostos, que não ajudam a entender o que está acontencendo na cena – As cena da morte do Javali e da cabeça “cortada” no capítulo 3, seria bem mais memoráveis com uma página dupla -.
Conclusão
Eu justamente escolhi não realizar grandes comparações com Ansatsu Kyoutshitsu ou Neuro, pois, se compararmos Nige Jouzu no Wakagimi com as obras precedentes do autor, perceberemos que a série poderia SER MUITO MELHOR – Eu quis avaliá-la como uma nova série, sem hype, sem grandes expectativas, mas mesmo assim, a sua qualidade é muito decepcionante. Entre os quatros novos mangás, na minha opinião, é a série mais problemática, mesmo eu não tendo certeza se podemos definir a pior série dessa nova leva.
A verdade é que Nige Jouzu no Wakagimi (The Elusive Samurai) não é uma tragédia completa, mas é uma série com tantos defeitos, que tornam sua leitura decepcionante e massiva: Os poucos lados positivos (O universo interessante e a arte macabra) não conseguem esconder os grandes defeitos que assombram os capítulos do mangá. O resultado acaba sendo um mangá que poderia entregar MUITO mais, se talvez o autor tivesse um melhor editor para guiá-lo.
Eu acho que está na hora de aprendermos que autor veterano não é sinônimo de qualidade.
Nota: 4.5 / 10