Apologia ao Plágio?
Chegou o momento de concluir a leva de março, com o terceiro e último mangá lançado nesse período: Time Paradox Ghostwriter. Os seus companheiros de leva foram Shinrin Ouja Moriking e Bone Collection. Time Paradox é escrita pelo novato Kenji Ichima e desenhada por Tsunehiro Date, e atualmente vocês podem encontrar os seus capítulos traduzidos em inglês e espanhol na Manga Plus, ou em português traduzido pela AMA Scans.
Antes de começar essa “Crítica” ao mangá; vamos analisar um pouco seus autores. O escritor, Kenji Ichima, que já tinha lançado na NEXT o One Shot “Bokura no Q”, que acabou sendo uma serialização curta na Ura Sunday. Porém essa é a sua primeira obra na revista e primeira grande obra. Já o desenhista, Tsunehiro Date já tinha desenhado Tokyo Wonder Boys, série que vive dentro do coração de muitas pessoas, e escreveu e desenhou Cross Account, um cancelamento que muitos consideram extremamente injustos.
Times Paradox Ghostwriter estreia em um momento no qual a revista está loucamente procurando por novos sucessos: O encerramento de Kimetsu no Yaiba, Yakusoku no Neverland, Yuragi-Sou no Yuuna-San e Haikyuu!! em menos de um mês trouxe uma grande crise na revista, que só deve terminar em 2022. Por isso, a série estreou no momento perfeito para se tornar um novo sucesso. Os editores estão totalmente dispostos a dar o tempo necessário para as novas séries desenvolverem as suas histórias. Será que Time Paradox Ghostwriter tem o necessário para sobreviver?
Premissa
A história segue a vida de um mangaká novato, Teppei Sasaki, que não consegue produzir nenhuma série que consiga agradar os editores. Os seus One-Shots são considerados medíocres, mesmo tendo uma arte muito interessante. O seu sonho é criar uma história que possa inspirar as pessoas, mas depois de tantos fracassos, Sasaki começa a duvidar da sua própria capacidade como autor e desenhista.
Tudo muda quando, no seu micro-ondas, aparece uma Weekly Shonen Jump de 10 anos do futuro. Essa Shonen Jump traz uma nova série espetacular, White Knight, produzida por Itsuki Aino, uma garota desconhecida. Sasaki ao ler essa nova série percebe que tem em suas mãos, a possibilidade de lançar um grandíssimo sucesso.
Assim, utilizando a própria arte, cópia o projeto de Aino, e apresenta ao seu editor, que acaba se apaixonando pelo mangá. Nas semanas seguintes, o protagonista continua recebendo as versões do futuro da Weekly Shonen Jump, e continua produzindo novos capítulos de White Knight, porém, Itsuki Aino, ainda uma garota simples do colegial, percebe que projeto que ela ainda está idealizando, por algum motivo, foi parar na Weekly Shonen Jump. O que ela vai fazer?
Roteiro (Volume 1)
Como estamos falando de uma dupla, quando o assunto é roteiro, tenho que me referir principalmente à Kenji Ichima. Diversamente dos demais mangás que comentei os sete primeiros capítulos (por isso somente o primeiro volume) com Time Paradox Ghostwriter irei comentar os onze primeiros, para assim dar uma ideia mais precisa do roteiro da série, que na minha opinião, é uma grande montanha russa. Nesse tópico comento os primeiros sete capítulos:
Inicialmente Time Paradox Ghostwriter dá para entender que será uma série sobre a produção de um mangá de sucesso imediato e a relação conturbada entre Sasaki, a sua moral e Aino. Os dois primeiros capítulos são praticamente centrados justamente na produção dessa nova série, White Knight. Vemos imediatamente que a roteirista não quer ser comparada com Bakuman, por isso adota algumas estratégias narrativas diferentes, como por exemplo, não mostrar muito o processo de criação de um capítulo. Estratégia que porém pode ter ajudado a deixar a série mais “pobre”.
A comparação com Bakuman, mesmo com essa mudança, acabou sendo inevitável. Mesmo eu gostando da série, por acreditar inicialmente que seria uma obra sobre o processo de criação de mangás na Shonen Jump, pensei que Time Paradox Ghostwriter estava pecando em não mostrar certos aspectos da produção deu m novo mangá ou aspectos da vida de um mangaká. De qualquer modo, eu ainda estava gostando do decorrer da série.
Depois, no terceiro capítulo, vemos o primeiro real desenvolvimento de Aino, a personagem que teve a sua história roubada. Talvez um dos pontos mais positivos de Time Paradox seja justamente a relação, que a partir do terceiro capítulo, começa a se criar entre Sasaki e Aino. Esses são os elementos que me despertaram mais curiosidades e transformaram a série em algo mais diferente, mais criativo. Mesmo que o desenvolvimento também tenha tido problemas (A série tem muitos pequenos problemas que se somam).
Inicialmente tenho que dizer que quando terminei o primeiro capítulo, me veio em mente realmente o plágio: Comentei no grupo da Equipe do Analyse It, que não tinha gostado do protagonista por ele ser um idiota que rouba a ideia dos outros, mas a roteirista, a partir do terceiro capítulo, começa a mostrar os problemas morais da escolha de Sasaki – Kenji Ichima começa a dar uma profundidade maior a sua história, que parecia ser somente um mangá “estilo Bakuman”.
É importante dizer que porém o roteirista nunca é realmente crítico a ação de Sasaki, e em certos momentos parece que o protagonista até tinha razões válidas em roubar a ideia de Aino, e isso pode ter irritado ainda mais outros leitores japoneses. Eu acho que talvez ter feito a Aino uma personagem mais inteligente e que admirasse menos o protagonista, seria algo muito melhor – Imagine se Aino estivesse realmente investigando de como Sasaki teve sua mesma ideia, ao invés de simplesmente admirá-lo por ter tido a sua mesma ideia? Seria bem mais interessante.
Entre o quarto e sexto capítulo vemos a história avançar muito rapidamente: A autora continua a desenvolver a culpa moral que o protagonista sente, a personalidade inocente e doce de Aina, e várias outras questões. É apresentado também os assistentes de Sasaki, que claramente teriam um desenvolvimento mais profundo, se a série não tivesse sido mal recepcionada. Vemos também a recepção da série e as consequências dessa boa recepção.
Porém, já entre o quarto e sexto capítulo percebemos alguns problemas graves com Time Paradox Ghost Writer – Esses problemas evitavam que eu terminasse a leitura da série totalmente surpreso – Os capítulos não parecem ter uma evolução fluída, são vários saltos temporais muito rápidos. Dizendo spoilers mínimos. Em sete capítulos vemos a série: Apresentar o protagonista, apresentar Aino, apresentar todos os assistentes, transformar a série em um sucesso mundial, ter uma proposta de anime para o mangá.
Claramente a roteirista queria ir diretamente ao ponto que mais importava, que é o drama entre Aino e Sasaki, porém para isto atropelou vários pontos interessantes que a série poderia desenvolver. Pontos que transformaria o roteiro de Time Paradox em um material mais rico e refinado: Atropelou toda questão do desenvolvimento de uma série de sucesso e os personagens secundários (que eram os assistentes). O ritmo de Time Paradox acabou sendo, na minha opinião, um segundo ponto que não me agradou. E essa questão se acentuou no quinto e sexto capítulo.
O sétimo capítulo termina com um grande Plot Twist que deixou a maioria dos leitores ocidentais animados e eufóricos: Esse capítulo me lembrou o motivo pelo qual eu estava lendo a série. É uma série com conceitos extremamente interessantes e um drama que realmente pode pegar o leitor, se bem desenvolvida. Time Paradox Ghost Writer pode ter apresentado um primeiro volume inconstante e com ritmo que parecia que eu estava dentro de uma montanha russa instável, porém, foi uma aventura que achei bem prazerosa.
Arte
Conhecemos o Tsunehiro Date em 2014, com Tokyo Wonder Boys, e já na sua primeira série, a sua arte tinha sido extremamente elogiada. Com Tokyo Wonder Boys o desenhista se colocou no “Hall” dos mangás novatos com artes mais interessantes e detalhadas que a Shonen Jump tinha. E justamente por causa da sua arte, recebeu a possibilidade de lançar Cross Account em 2017, que acabou cancelado. Para muitos, um cancelamento injusto.
Em Time Paradox Ghostwriter, a arte de Tsunehiro Date dá mais um passo a frente: O artista consegue expor muito bem as cenas dramáticas e consegue dar emoção as cenas no qual o protagonista está desenhando. É inegável o seu talento, porém, também é inegável que a arte sofre com um pequeno problema: Cenas repetitivas. As expressões de preocupação e de tensão são repetidas constantemente ao longo dos capítulos.
O quadro acima, no qual vemos Sasaki Teppei desenhando preocupado, deve ter sido repetido três ou quatro vezes em sete capítulos. Certos quadros dá uma sensação de “Deja Vu”, mas talvez o problema resida mais no roteiro do que realmente na criatividade artística de Tsunehiro Date. Tirando esse pequeno problema, Time Paradox Ghostwriter é um festival de quadros belos, bem organizados e bem com várias tonalidades de cores. O branco, preto e cinza são utilizados de modo genial.
A Polêmica
O que aconteceu com Time Paradox Ghostwriter não foi uma simples recepção negativa, mas sim uma polêmica: A série foi acusada, por alguns leitores, de ser uma apologia ao plágio – Já que o protagonista consegue fazer um sucesso enorme copiando a obra de uma outra pessoa -. Quando na verdade, o plágio é simplesmente um elemento narrativo que guia a história e traz gera as crises morais que seguem o protagonista ao longo dos primeiros capítulos.
Porém sejamos sinceros, seria uma mentira da minha parte resumir a má recepção de Time Paradox a polêmica do plágio: Nem sabemos quanto grande tenha sido essa polêmica no público comum. Vimos, sim, várias pessoas irritadas no Twitter, mas será que isto é realmente o motivo pelo qual mais de 1 milhão de compradores da revista não gostaram do mangá?
A série tinha outros problemas estruturais, que citei nos parágrafos acima, que fizeram muitos não se apaixonarem completamente pelo mangá. A comparação com Bakuman também não ajudou nem um pouco a obra. Os rápidos pulos temporais fizeram que os leitores nem entendessem bem sobre o que esse tratava esse tal de “White Knight”. A série venderá menos de 5 mil cópias, e o motivo claramente não é somente a polêmica do plágio.
Os primeiros capítulos deixaram a entender que a série seria algo que não era (uma representação da vida de um mangaká), o que pode ter decepcionado algumas pessoas. Time Paradox é uma ótima série que tinha vários erros que levavam os leitores a não entenderem muito bem sobre o que se tratava. Faltou experiência por parte do roteirista.
Problemas (Volume 2).
Com a má recepção, vemos a partir do nono capítulos, a série mudando completamente o seu ritmo: Quando lancei esse análise, Time Paradox Ghostwriter se encontrava no seu décimo segundo capítulo (sendo que li os onze primeiros), e tudo indica que irá ser encerrado com 14 ou 15 capítulos, a quantidade o suficiente para um segundo volume pequeno.
A partir do nono capítulos descobrimos várias questões que deviam, provavelmente ser reveladas, somente nos meados da série, e vemos o autor mudar totalmente a narrativa da série. Itsuki Aino se torna muito mais protagonista e a viagem no tempo se torna ainda mais presente. Provavelmente é uma estratégia para conseguir encerrar a série em cinco ou seis capítulos. Para mim ficou óbvio que o editor avisou que a série seria cancelada.
Eu repito, Time Paradox Ghostwriter podia ter seus defeitos e decidi citá-los, para deixar muito claro o motivo do seu fracasso, mas era uma série original, com uma ótima arte, com uma boa história. E sabe, esses últimos capítulos, enquanto tudo ia desabando para Sasaki Teppei, que tudo ia desabando para Aino, e víamos que tudo ia desabando para a dupla de autores, percebi que Time Paradox Ghostwriter trata de um assunto muito tocante:
O encerramento. O que é o encerramento de uma série? O que é o encerramento de uma vida? E se a série terminar do nada, ela perde o seu valor? Uma obra deve obrigatoriamente ter um encerramento e ser continuada por outras pessoas, pois é necessário que ela continue? O autor obviamente não entra nessas questões mais filosóficas de modo profundo, é ainda um mangá Shonen, mas de certo modo, podemos refletir sobre o que Time Paradox está nos apresentando.
Vale a Pena Ler?
Então, vamos para a pergunta: Vale a pena ler Time Paradox Ghostwriter? Então, a série tem seus defeitos claros, comentei de todos eles nessa análise, porém mesmo assim é uma série divertida e que se o autor conseguir gerir bem esses últimos capítulos, pode inclusive entregar um encerramento “redondo”, mesmo que apressado. Eu não diria que meu tempo lendo Time Paradox Ghostwriter, mesmo com o claro cancelamento que está por vir, tenha sido um tempo jogado fora.
Desde 2012, eu comecei a seguir todas as séries da revista – Algumas através raws, outras através a tradução em inglês ou português, mas eu segui realmente todas – E devo dizer que eu continuo me divertindo seguindo, mesmo sabendo que mais de 80% das séries que eu leio será cancelada. O motivo pelo qual acabo me divertindo? Eu aceito que esses mangás podem terminar a qualquer momento, como uma relação amorosa ou a própria vida.
Time Paradox Ghostwriter de certo modo conversa sobre como uma vida pode terminar repentinamente, sem realmente ter uma conclusão: Como uma série pode não ter uma real conclusão. Nós pensamos nossa vida como um ciclo que irá se encerrar, mas na verdade, muitas vezes não tem um encerramento – simplesmente acaba em um acidente de carro -. Uma relação com uma namorada ou sua esposa, também pode terminar como uma um mangá Shonen Jump, de modo apressado, sem que seus planos e sonhos juntos tenham sido alcançados.
Mas sabe o que realmente importa nisso tudo? Não é realmente o encerramento. Damos muito valor para como uma série irá terminar. Como próprio Sasaki e Aino davam valor demais no ato de continuar “White Knight”. E como damos muito valor em como “Time Paradox” iria continuar ou terminar. Devemos simplesmente aproveitar os capítulos que nos foram dados e como eles nos divertiram. Não foi divertido ler os sete primeiros capítulos da série? Não foi surpreendente o seu sétimo capítulo? Então, valeu a pena.
Sim, é ótimo ver a sua série preferida sobrevivendo, tendo vários capítulos e tendo um belo encerramento, mas nem sempre é assim, na verdade, na maioria das vezes não é assim. Podemos aproveitar uma bela série até mesmo por apenas 10 capítulos, e aproveitar esses 10 capítulos bem escritos. Então, não tenha medo de ler Time Paradox pois a série acabou sendo cancelada. Se tu achou interessante sua ideia, LEIA. Você encontrará vários defeitos, mas também tem vários pontos positivos e interessantes nesses capítulos da série. Time Paradox Ghostwriter merece ser lido mesmo com o cancelamento.
Nota: 5.5 / 10.
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A Edição #36-37 da Weekly Shonen Jump revelou: Mitama Security foi cancelado com apenas 47 capítulos. E tudo indica que o próximo cancelado será Bone Collection. pic.twitter.com/tRz4cVqf61
— Leonardo Nicolin (@AnyoneNico) August 6, 2020