Reflexões #01: Briga de Rua e a Weekly Shonen Jump.
Anos atrás, eu escrevia semanalmente uma coluna chamada ‘Reflexões Semanais’, na qual eu havia escrito mais de 46 artigos, nos quais simplesmente comentava sobre questões que passavam pela minha mente. Um jogo me deu a vontade de ressucitar essa coluna, mesmo que não seja semanalmente.
- Escrito por Leonardo Nicolin
Enquanto jogava ‘Pocket Bravery’, um jogo brasileiro indicado ao The Game Awards, comecei a refletir sobre alguns gêneros presentes ou não na revista. O jogo, em sua modalidade história, unia com maestria a jornada do herói, muito comum nos mangás shonen, com lutas de rua comuns em jogos como Street Fighter ou Tekken. Contudo, após terminar a obra, veio-me à mente que fazia tempo que a Weekly Shonen Jump não lançava um mangá que poderíamos considerar como ‘briga de rua’, sendo um dos últimos Ultra Battle Satellite (UBS), de 2015.
Ainda me lembro do ‘hype’ em torno da obra, que agradava tanto o público da 2ch quanto o público leitor da Kyodai, que a estava traduzindo. UBS contava a história de um Reality Show, “UBS”, que transmitia ao vivo uma competição de luta na qual os participantes tinham que encontrar, a qualquer momento do dia, seu adversário no meio da rua para derrotá-lo e conquistar mais pontos. Com uma arte que lembrava Baki, outro mangá de luta, UBS entregava uma boa pancadaria franca com chutes e socos.
Os personagens, em grande parte carismáticos, usavam suas habilidades em artes marciais para se defender e levar a vitória para casa. Era clara a inspiração que o autor pegava em mangás clássicos e também em jogos de luta: ia da personalidade louca de alguns personagens até ao modo como lutavam, com auras que exalavam do próprio corpo.
Infelizmente, UBS acabou não dando muito certo, já que estreou em uma leva na qual outros dois mangás tiveram uma recepção ainda melhor: Black Clover e Kagamigami. UBS, contudo, não é a única tentativa de mangás do gênero na revista. Alguns meses antes, tinha sido lançado na revista Judos, que começou como um estranho mangá de Judô, mas depois veio a dar indícios que podia se tornar um mangá de luta de rua. Mais de dez anos antes, em 2002, também tivemos outra estreia muito curiosa nesse sentido: Ultra Red, de Nakaba Suzuki. Quando comentamos sobre mangás de luta recentes, é impossível não pensar no último mangá lançado pelo autor de Nanatsu no Taizai na Weekly Shonen Jump.
Nakaba Suzuki estreou na revista em 1998 com o mangá “Rising Impact”, um mangá de golfe que teve uma recepção positiva, mas foi cancelado. Tudo estava na normalidade até quando, como Michael Jackson em Thriller, Rising Impact voltou dos mortos, recebendo um segundo lançamento da revista. Alguns dizem que esse segundo lançamento se deve a um arrependimento dos editores, outros dizem que o relançamento já tinha sido planejado quando a série foi cancelada. Independentemente de qual versão é a verdadeira, Rising Impact se tornou um dos poucos mangá da história a ser ‘descancelado’.
Também se tornou assim o único mangá da história a ser cancelado duas vezes. Na edição #12 de 2002, a Weekly Shonen Jump decidiu cancelar definitivamente o nosso querido mangá de golfe. Nakaba Suzuki mesmo assim decidiu continuar na revista e, ainda naquele ano, lançou um novo mangá, Ultra Red. A obra, que durou um pouco menos de um ano na revista, contava a história de Sumeragi Sen, um lutador de Haikaiken, uma luta que seu pai o ensinou. Seu objetivo é se tornar o homem mais forte do mundo, contudo, para isso, terá que derrotar o seu pai.
Ultra Red seguia uma tradicional jornada do herói que tenta superar o seu pai, e mesmo não trazendo grandes novidades, era um mangá interessante de se acompanhar, que até agradou parte do público da revista, mas acabou sendo cancelado devido à revista cheia de sucesso na época. A Weekly Shonen Jump tinha tantos mangás bem recepcionados em 2003-04 que teve que cancelar até mesmo obras veteranas como Rookies e Shaman King. Ultra Red, que era uma obra nova com uma recepção boa, mas nada incrível, não teve chances em um dos períodos mais incríveis da história da revista.
Nakaba Suzuki, depois desse fracasso, migrou para a Weekly Shonen Magazine, mas não sabemos se por decisão própria ou por ter sido demitido. Na sua nova revista, Nakaba lançou em 2007 “Kongou Banchou”, um mangá que pescava muito nos clássicos de lutas. E depois lançou Nanatsu no Taizai em 2012. A Weekly Shonen Jump assim perdeu um grande talento que, talvez, nunca teria se tornado um dos maiores nomes da indústria se não tivesse mudado de revista.
Porém, é curioso notar que uma revista que tem tanta história com mangás de luta, seja com super-poderes ou sem, está cada dia com mais dificuldades em achar mangás do gênero, enquanto revistas como a Shonen Magazine ainda encontram mangás que, mesmo não sendo do gênero, dialogam muito bem com ele, como Tokyo Revengers. É inegável que certas obras, como Ayashimon e Harapeko no Marie, se inspiram nos clássicos de artes marciais e clássicos da Weekly Shonen Jump como Hokuto no Ken e JoJo, mas quando o assunto se trata de encontrar novos sucessos de briga de rua, está mais difícil, sendo Jujutsu Kaisen aquele que mais se aproxima. Talvez isso aconteça por não saberem inovar como devem.
Sim, certos mangás com ideias criativas, como Ultra Battle Satellite, vão dar errado, assim como outros mangás que conseguem entregar uma história tradicional, como Ultra Red, de boa qualidade, também irão dar errado. Ambos os Ultras eram mangás diferentes, mas que pertenciam ao mesmo gênero, tentavam propor algo. Ambos tinham qualidades e ambos acabaram dando errado, talvez por não terem aquela pitada de sal a mais ou simplesmente por estrearem em um período não correto para eles. Contudo eu acho sempre válido seguir a estrada de Ultra Battle Satellite: apostar em algo nunca visto dentro da Weekly Shonen Jump.
Para mim, um dos problemas atuais da atual Weekly Shonen Jump (WSJ) reside na visão editorial do Editor-Chefe, Nakano. Em vez de reconhecer a capacidade da revista em criar tendências, como fez no passado, ele parece tentar imitar o que já está sendo bem-sucedido, inclusive dentro da própria revista. Falta a Nakano uma visão verdadeiramente inovadora para encontrar autores e editores que não apenas se adaptem ao que está na moda, mas que tenham a habilidade de propor histórias novas, como Ansatsu Kyoushitsu, Yakusoku no Neverland, Shokugeki no Souma, World Trigger, PSI Kusuo Saiki, Isobe Isobee Monogatari, Dr. STONE e muitos outros mangás que, na gestão passada, entregaram narrativas nunca vistas na Weekly Shonen Jump. Infelizmente, o editor-chefe parece estar aprisionado e congelado em suas limitações criativas.
Inovar não significa abandonar as noções de narração conhecidas; é possível inovar mantendo a jornada do herói. Ao jogar Bravery Pocket, senti que estava me divertindo com uma história dinâmica que conseguia unir de maneira eficaz elementos geopolíticos, algo que geralmente os jogos de luta não conseguem realizar muito bem, por isso tinha um toque de novidade. Ao mesmo tempo, entregava uma jornada do herói que soava familiar, pois seguia o lema da Weekly Shonen Jump: Amizade, Esforço e Vitória. Isso me proporcionou uma sensação de nostalgia enquanto jogava Bravery Pocket em meu PC.
Na minha opinião, inovar significa saber entregar algo novo, mesmo que sua história contenha elementos do passado. Você não é obrigado a seguir o lema da Weekly Shonen Jump ao lançar uma série na revista, mas se conseguir apresentar algo novo mesmo com certos elementos do passado, isso é verdadeiramente inovador, na minha opinião. Talvez Nakano devesse apostar mais em histórias shonen que buscam inovar de alguma forma, mesmo que seja nos pequenos detalhes. Talvez seja o momento de lançar um novo mangá de briga de rua com poderes ou até mesmo sem; o importante é que seja uma ideia nunca vista na Weekly Shonen Jump.
Eu vou aproveitar esse momento para fazer um pedido a vocês, o Pocket Bravery está disputando o The Games Awards, e como eu gostei bastante de jogar esse jogo BRASILEIRO, eu peço para vocês votarem nele como Melhor Jogo de Luta, para assim termos a VITÓRIA de um estúdio brasileiro. Esse encerramento da matéria não é uma publicidade (pode parecer, mas não é), é somente um pedido sincero meu para apoiar esses desenvolvedores brasileiros incríveis.
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