Já se passaram quase 20 anos desde o fim de Death Note, mas o icônico mangá continua a alimentar debates intensos no Japão. Na semana passada, um usuário da Animanch, um dos maiores fóruns de discussão de animes e mangás do país, reacendeu uma questão que marcou a época do lançamento da série: “Existia uma relação de amizade entre L e Kira?”
A dúvida nasce de uma fala do próprio L, quando afirma: “Você é o meu primeiro amigo”, deixando Light visivelmente surpreso. A frase, dita de forma aparentemente casual, levou muitos leitores a questionarem se L realmente estava sendo sincero ou se apenas encenava, em uma tentativa de desmascarar a verdadeira identidade de Light.
O tópico rapidamente se transformou em uma conversa acalorada, com diversos participantes compartilhando interpretações. Mas vale retomar o comentário inicial, responsável por reacender a discussão: a dúvida sobre os verdadeiros sentimentos de L.
“Era uma relação de amizade superficial, mas será que L tinha algum apego por Light, não querendo que ele fosse o Kira?
Por outro lado, Light não hesitou em tentar matar L.”
O comentário, como se percebe, não se concentrou nos sentimentos de Light, já que ele matou L sem hesitação. Já o investigador, em seus últimos momentos, pensou: “Eu sabia… eu não estava errado… mas…” – morrendo antes de concluir o pensamento. Foi a partir daí que os japoneses iniciaram uma ampla discussão, da qual destacamos alguns dos principais comentários:
“Para chamar isso de amizade, o encontro e a relação entre eles não seriam calculistas demais?”
“O fato de o mesmo fanbook mostrar várias interpretações já indica que L era uma existência que não podia ser resumida de forma simples. Não chega a ser amizade, mas também não era alguém que pudesse ser descartado de qualquer jeito. Como o Near disse: Ele foi uma pessoa pela qual valia a pena arriscar a vida.”
“Só de ver a expressão maligna de Light depois de matar L, dá pra dizer que… Do L para Light, pode até ter havido algo. Mas do Light para L, definitivamente não havia esse tipo de sentimento.”
O Fanbook, também conhecido como “Volume 13”, trouxe informações que, em certo ponto, soam contraditórias. Em determinado trecho, afirma que L não poderia ter amigos, e por isso estaria fingindo — visão defendida por parte dos usuários.
“É certo que ambos se relacionavam partindo do pressuposto de que o outro era um inimigo que precisava ser eliminado. Para Light, L era um estorvo irritante que mais cedo ou mais tarde teria de ser morto; para L, Light era um mal imperdoável que em algum momento deveria ser enviado à guilhotina.
Mas, apesar disso, acho que coexistia também um certo elemento de afeição. Light, por exemplo, pensava coisas como: ‘Pff, então é só isso? Que sem graça… se fosse o L, ele teria me atacado de forma muito mais implacável’ ao comparar Near a L.
E do lado do L (na verdade foi Near quem disse isso), havia essa visão: ‘O Kira original era um inimigo tão formidável que valia a pena arriscar a própria vida para decidir as coisas com ele. Em comparação, esse tal de C-Kira é patético demais.’ Ou seja, havia ali uma espécie de amizade — não no sentido de suavizar o combate, mas de uma ligação que jamais seria motivo para aliviar a mão.”
Em outro ponto, o Fanbook apresenta duas possibilidades para a continuação do pensamento interrompido de L antes de sua morte — versões que acabam se contradizendo. A hipótese de que L não queria que Light fosse o Kira é a que mais alimenta a interpretação de que havia, sim, uma inclinação à amizade.
“Uma das possibilidades levantadas pelo autor sobre o monólogo final (citado no fanbook) é: ‘Eu não estava errado… mas gostaria de estar errado.’ Por isso, penso que L pode ter sentido certo grau de amizade por Light.
No mesmo fanbook também é sugerido que a fala poderia ser outra, como: ‘Mas aqui, eu perdi.’ Então é natural que a interpretação varie de pessoa para pessoa.”
A verdade é que os autores deixaram esse ponto em aberto, permitindo diferentes conclusões. Tanto a visão de que L estava apenas fingindo, quanto a de que “gostaria de estar errado”, são válidas. Dentro da própria obra, nada confirma de forma definitiva os sentimentos de L.
No geral, muitos japoneses acreditam que, da parte de L, poderia ter surgido uma amizade. Light, por sua vez, sempre teve como objetivo matar seu adversário.
Light não poderia mesmo ser amigo de L?
Ao chegarem à conclusão de que Light não tinha intenção de amizade, um dos usuários lembrou que, quando perdeu a memória, ele passou a se aproximar de L, chegando a concordar em certos pontos. Para esse usuário, aquilo poderia ser interpretado como amizade.
“Parece que o Light, quando perdeu a memória, sentia alguma amizade por L. Como ele não se torna uma pessoa completamente diferente antes e depois de perder a memória, acho que dá pra dizer que havia, sim, um pouco de amizade da parte do Light, não é?”
Essa visão abriu um novo canal de debate: em um mundo no qual Light não tivesse encontrado o Death Note, será que os dois poderiam ter sido amigos? Ou a diferença ideológica – Kira mais punitivista e L mais voltado à justiça – impediria essa possibilidade?
“Rivais” parece se encaixar melhor, não é? Por causa das diferenças de ideologia, eles não poderiam ser amigos, mas acho que se reconheciam mutuamente. Ainda assim, se Light não tivesse se tornado Kira e tivesse conhecido L, provavelmente poderiam ter sido amigos.”
“De certa forma, acho que era uma amizade estranha, como a do Jonathan e do Dio. Havia neles a consciência de serem inimigos, a consciência de serem rivais à altura, e até algo parecido com amizade. Acho que acabaram se tornando uma existência única, insubstituível um para o outro.”
Definir o que constitui amizade é sempre complexo. Mas como ambos possuíam habilidades de nível mundial, havia certo prazer em competir um com o outro, talvez até vissem no rival alguém especial. Ainda que, no fim, a vitória pessoal fosse absoluta.
A comparação com JoJo – entre Jonathan e Dio – agradou bastante os japoneses, que perceberam o mesmo aspecto na relação entre Light e L. Contudo, em geral, prevalece a visão de que uma convivência entre os dois seria improvável, dada a diferença ideológica. Uma amizade competitiva, fora dos padrões, em que um buscava continuamente derrotar o outro, talvez fosse possível.
Mas isso seria realmente uma amizade? É possível uma relação assim, ou trata-se apenas de ficção? Difícil dizer. De qualquer modo, a discussão trouxe diferentes pontos de vista e, mesmo sem conclusão definitiva – algo comum em fóruns online -, cada participante pôde expor sua interpretação. A maioria concorda que havia, sim, algum aspecto de amizade, ainda que inviabilizado pelas circunstâncias do encontro entre Light e L.
