
Com o anime que estreou em julho, muito se discute sobre Gachiakuta ser, ou não, um sucesso de vendas. Até mesmo páginas que normalmente não abordam esse tema têm tentado compreender a situação da série no mercado japonês.
Por isso, chegou o momento do Analyse It, maior portal sobre vendas de mangás no Brasil, apresentar uma análise completa do caso: vamos percorrer toda a trajetória da obra, do primeiro ao volume mais recente, e entregar um veredito. Afinal, Gachiakuta é um sucesso ou não?
Antes do Anime
O primeiro ponto a ser avaliado são justamente as vendas antes da adaptação animada. Quando estreou em 2022, Gachiakuta registrou uma boa recepção em seu primeiro volume, com quase 27 mil cópias vendidas. A série ainda surfava nos últimos meses do “boom” da pandemia e conseguiu se destacar dentro da Weekly Shonen Magazine, publicação que passava a apostar cada vez mais em comédias românticas.
A arte da autora Kei Urana, carregada de tons cinzentos e distorções, também se consolidou como um dos fatores que agradaram o público inicial.
Contudo, o que parecia ser um crescimento contínuo acabou se tornando uma montanha-russa até atingir o ápice no volume 5, que vendeu cerca de 37 mil cópias. Um aumento de aproximadamente 37% do seu público. Um resultado positivo, que colocava Gachiakuta entre os dez títulos mais vendidos da Magazine e no TOP 500 do mercado geral. Mas esse pico já revelava um problema: por algum motivo, a série não conseguia viralizar no Japão.
Nos meses seguintes, a obra seguiu bem recepcionada por seus leitores. No ocidente, começava a formar uma comunidade dedicada, sobretudo nas redes sociais, empenhada em convencer novos fãs a dar uma chance ao título. Ainda que longe de alcançar a base de Jujutsu Kaisen, Chainsaw Man ou outros grandes fenômenos, o engajamento era tão intenso que levou muitos a acreditar que Gachiakuta também fosse um sucesso estrondoso em solo japonês.
A percepção sempre foi essa: o público ocidental imaginava que Gachiakuta vendia mais do que realmente vendia no Japão. Não que os números fossem ruins, pelo contrário, até o sétimo volume eram sólidos para o mercado, mas nunca chegaram ao nível de séries como Sakamoto Days, Yome no Tsugai, Ao no Hako ou Kagurabachi, todas acima das 120 mil cópias mesmo sem anime. O entusiasmo internacional jamais se refletiu em território japonês.
Além disso, fatores como a crise populacional e econômica, somados à concorrência de novas mídias (principalmente as redes sociais), fizeram o mercado de volumes físicos encolher gradualmente. Esse movimento já foi analisado em diversos artigos e vídeos do Analyse It. Não apenas o formato físico perdeu força, como o crescimento do digital também não conseguiu compensar a queda. Hoje, os leitores consomem mais mangás de forma gratuita ou por meio de assinaturas. Nesse cenário, Gachiakuta tornou-se mais uma vítima dessa transformação.
Com pausas na publicação e decisões narrativas que esfriaram o interesse, a série enfrentou queda preocupante: de 37 mil cópias no volume 5, em 2022, para 16 mil cópias no volume 14, em 2024. Uma perda de 56,75% dos leitores – mais da metade em apenas dois anos.
Assim, é inegável que Gachiakuta chegou ao anime em situação delicada. A obra não corria risco imediato de cancelamento, mas estava longe de figurar entre as mais promissoras da Shonen Magazine. É raro ver mangás que vendem abaixo de 30 mil cópias antes da estreia animada explodirem e se tornarem grandes sucessos. O objetivo, de forma realista, era alcançar entre 40 e 60 mil cópias após o anime.
O Anime
Com a estreia da adaptação produzida pelo estúdio Bones, a série voltou aos holofotes. A Crunchyroll investiu pesado na divulgação, mirando principalmente o público ocidental. Com o mercado em baixa e poucos novos sucessos em 2025, a plataforma viu na comunidade engajada de Gachiakuta uma chance de transformar a obra em um nome de peso.
Essa publicidade, aliada ao apoio de influenciadores, trouxe nova notoriedade no ocidente, enquanto no Japão a campanha se manteve mais modesta, próxima da realidade. Os números, contudo, foram animadores: no MyAnimeList, Gachiakuta atingiu 248 mil seguidores, superando a segunda temporada de Kaiju No. 8 (244 mil), mas abaixo de Kaoru Hana wa Rin to Saku (253 mil) e de Dandadan (360 mil), maior sucesso da temporada.
No Japão, a divulgação também foi robusta para os padrões da Shonen Magazine, e o impacto apareceu nos números. O volume 15 duplicou as vendas em comparação ao anterior, reflexo direto do anime.
Além disso, os volumes antigos receberam impulso: mais de 114 mil cópias adicionais em pouco mais de um mês, sinal de que novos leitores estão chegando e buscando o material original. A tendência é que esse número cresça ao longo dos episódios e após a conclusão da primeira temporada.
Mesmo assim, o anime não deve transformar Gachiakuta em um fenômeno à la Jujutsu Kaisen, que ultrapassa 1 milhão de cópias – patamar hoje alcançado apenas por Spy x Family e One Piece. O “hype” sempre veio mais do ocidente (e também de públicos coreano e chinês) do que do Japão.
Gachiakuta vende bem, mas jamais será um Jujutsu Kaisen.
Mas por que Gachiakuta não decola?
A resposta é complexa, mas, em termos técnicos, parte de dois fatores. O primeiro é a arte carregada, de traços distorcidos, que afasta o público mais jovem e casual. Não são raros comentários em fóruns japoneses afirmando que a leitura é cansativa devido ao excesso de informação em cada página.
Curiosamente, é justamente esse aspecto que conquista os fãs mais engajados, especialmente no ocidente, acostumado com páginas mais densas.
O segundo motivo está no mercado: cada vez mais resistente a obras que constroem “mundos originais”. Hoje, os mangás de fantasia que emplacam costumam se apoiar em referências a RPGs ou elementos medievais – classes, raças mágicas e características conhecidas dos leitores – ou então em ambientações muito próximas da realidade. Obras como One Piece, Fullmetal Alchemist, Dragon Ball e Naruto, que criaram universos do zero, tornaram-se raras. Apenas alguns poucos títulos ainda conseguem romper essa barreira.
Esses dois fatores tornam Gachiakuta menos acessível no Japão, mas, ao mesmo tempo, mais atrativo no ocidente, onde há apreço tanto por mangás com mundos originais quanto por páginas densamente ilustradas, algo comum nos quadrinhos ocidentais. O resultado é uma recepção apenas “decente” no Japão e mais calorosa fora dele, sem jamais alcançar o patamar de Jujutsu Kaisen.
Veredito – É um sucesso? Terá segunda temporada?
As vendas atuais de Gachiakuta são positivas. O volume 16 deve ultrapassar 40 mil cópias em dez semanas, novo recorde da série, recolocando-a entre as mais vendidas da Shonen Magazine. O anime também foi bem recebido: não é destaque absoluto no Japão, mas cumpre seu papel. Já no ocidente, a obra ganhou novas licenciaturas, alcançou boa audiência, repercutiu bastante e figurou entre os resultados mais sólidos da temporada.
Pode-se considerar o anime um sucesso. Tanto a produtora quanto a editora provavelmente lucram com a adaptação, ainda que em escala moderada, por causa das vendas não explosivas e gastos com o marketing. Não se trata de um Jujutsu Kaisen, nem sequer de um Dandadan em alcance, mas há, provavelmente, rentabilidade. Afinal, nem todo título precisa ser um fenômeno cultural ou vender milhões por volume para ser considerado bem-sucedido.
Gachiakuta atinge bons números dentro da EXPECTATIVA REAL que sempre existiu: entre 40 e 60 mil cópias após o anime no Japão. Se mantiver essa faixa, será um sucesso; se superar, será uma surpresa positiva. Até aqui, tudo indica que está no caminho certo. No ocidente, a série alcançou algo mais – novamente, nada de espetacular, mas um bom resultado.
Quanto a uma segunda temporada, trata-se de uma possibilidade concreta, mas não uma certeza. Dependerá mais da prioridade da produtora e da disponibilidade do estúdio.