É comum aqui no Analyse It discutirmos as vendas de várias séries, já que comentamos continuamente sobre a popularidade dos mangás. Contudo, muitas vezes essa análise é feita somente dentro da realidade de cada revista, sem expandir para uma visão mais geral do mercado. Nessa análise eu decidi unir todas as revistas shonen que analisamos no site, que são as cinco principais do mercado, para assim termos uma visão mais geral do mercado shonen. Irei comentar os mangás mais vendidos, as obras sem anime mais vendidas e minhas principais preocupações
Foram recolhidos os dados somente das revistas que analisamos no site, por isso as seguintes: Shonen Magazine, Shonen Sunday, Jump SQ, Shonen Jump, Shonen Jump +, Jump GIGA e V-Jump, sendo que essa última não é analisada pelo site, mas decidi colocar pois já tinha os dados de suas vendas. Como essa análise é centrada em ENTENDER O MERCADO SHONEN, que tem uma demografia específica, não será avaliada a Weekly Young Jump que é uma revista seinen que também cobrimos aqui no Analyse It.
Deste modo recolhi os dados das vendas DO PRIMEIRO MÊS das séries utilizando o Ranking Oricon e o Ranking Shoseki, enquanto alguns são os números precisos, aqueles que tive que recolher ao Ranking Shoseki é um número aproximado com uma margem de erro de 1 a 4 mil cópias – normalmente são os dados com números redondos. Lembrando que tanto o Ranking Oricon quanto o Ranking Shoseki recolhem somente as vendas FÍSICAS, e não as digitais. As vendas são referentes aos últimos volumes de cada uma dessas séries, lançadas até o dia 31 de Outubro de 2023. Foram cortados da análise todos aqueles mangás que vendem menos de 10 mil cópias no primeiro mês, para assim termos um “Sample” de somente mangás que vendem bem.
Atualização: Adicionei no dia 19/11/2023 as vendas da Shonen Champion, coletadas pelo nosso leitor iv11M no qual agradeço pela colaboração. Decidi adicioná-las para dar um quadro ainda mais completo do mercado. Foram adicionadas todas as séries da Akita Shoten (editora da Champion) que superam 10 mil cópias vendidas em 1 mês e que não eram Spin-Off em revistas secundárias, deste modo o único Spin-Off é Makai no Shuyaku wa Wareware da! que é lançado na revista principal. Mesmo assim a análise continuará centrada nas principais cinco revistas e plataformas.
RESULTADO
Legenda:
- Número em vermelho são os mangás sem anime.
- Franquia que já tiveram anime foram indicadas como “SIM”, mesmo a continuação ou o Spin-Off não tendo anime.
- Cores: Weekly Shonen Jump (Laranja), Shonen Jump + (Rosa), Jump SQ (Dourado), Weekly Shonen Sunday (Azul), Weekly Shonen Magazine (Verde), Weekly Shonen Champion (Lilás) e V-Jump (Marrom).
AS PRINCIPAIS REVISTAS
É clara que a liderança do mercado ainda está nas mãos do departamento da Shonen Jump, tanto com a revista semanal Weekly Shonen Jump quanto com a plataforma online Jump Plus, contudo as outras revistas ainda conseguem lançar obras de sucesso no mercado, com destaque para a Sunday com Sousou no Frieren e Shonen Magazine com Blue Lock. Essas últimas duas revistas, porém, demonstram ter dificuldades para competir com a força dos títulos da Weekly Shonen Jump, conseguindo colocar poucos mangás no TOP 20.
Quando avaliamos todo o TOP 71, vemos que a Weekly Shonen Jump tem 17 mangás que vendem acima de 10 mil cópias, enquanto a Weekly Shonen Magazine tem 16 mangás, uma diferença muito pequena que dá a entender que as duas revistas estão em uma situação parecida. O caso parece ainda melhor para a Magazine quando excluímos dos números da Weekly Shonen Jump os dois mangás em hiato: Ruri Dragon e Hunter x Hunter. E também excluímos o apenas cancelados Ichinose-ke no Taizai, que está na tabela por causa da data limite de corte (31 de Outubro), restando assim somente 14 mangás que vendem acima de 10 mil cópias.
A questão é que a diferença entre as duas revistas se torna gigantesca quando vemos a média de vendas dos mangás de ambas as revistas. A média total de vendas da Weekly Shonen Jump, contando também os mangás que vendem abaixo de 10 mil cópais, é de 250 mil cópias. Já a Weekly Shonen Magazine é de 43 mil cópias. A realidade é que a Weekly Shonen Jump tem poucos mangás, mas que vendem muito bem, enquanto a Weekly Shonen Magazine tem vários mangás que vendem entre 19 mil e 59 mil cópias. Entre as obras sem anime também vemos uma diferença: A média de vendas da Weekly Shonen Jump é de 49 mil cópias e a da Shonen Magazine é de 22 mil cópias.
Avaliando as demais revistas: A plataforma online Jump Plus atualmente tem 13 mangás que vendem acima de 10 mil cópias, logo abaixo das duas maiores revistas Shonen. Contudo a Jump Plus tem no seu catálogo mais de 70 mangás atualmente, por isso, uma quantidade preocupante de obras que não conseguem alcançar nem dez mil cópias. A Sunday vem logo após com 10 mangás que vendem acima de 10 mil cópias, sendo a revista atualmente não tem nenhuma obra que vende entre 10 e 27 mil cópias mensais, uma curiosidade muito estranha.
Concluindo temos a Jump SQ que também tem 10 mangás que vendem acima de 10 mil cópias, sendo assim uma das revistas mensais do mercado com maior número de obras que vende bem. A Shonen Champion tem 6 mangás, e entre as revistas semanais continua sendo a quarta mais forte – título que detém há decadas e parece que não vai conseguir mudar essa realidade tão cedo -. Mesmo assim, a Shonen Champion consegue ocasionalmente lançar bons sucessos como Baki e Marimashita, esse último que consegue entrar nos dez mangás mais vendidos entre as seis principais revistas shonen do mercado.
A V-Jump e Jump GIGA tem tão poucos mangás que não são relevantes nessa avaliação, os números foram adicionados somente para termos mais “samples” de mangás mesmo. Deste modo a Weekly Shonen Jump continua sendo a líder do mercado, não só tendo uma grande quantidade de obras que vendem bem com ANIME, mas também uma boa quantidade de obras SEM ANIME que tem potencial de começar a vender muito bem após uma boa adaptação. Enquanto as demais revistas parecem estar sofrendo mais nesse quesito.
MANGÁS QUE VENDEM ACIMA DE 100 MIL CÓPIAS
Foram recolhidos os dados de 140 obras, sendo que 71 delas superaram a nota de corte de 10 mil cópias. Se aumentarmos a nota de corte, somente 20 estão conseguindo vender acima de 100 mil cópias, dentre eles somente 4 são mangás sem anime: Kaiju no.8, Ruri Dragon, Ao no Hako e Sakamoto Days. Se excluirmos Ruri Dragon que está em Hiato, nos resta assim somente três mangás sem anime que conseguem vender extremamente bem.
No geral os números das vendas dos volumes diminuíram bastante, e se antes era normal um mangá estar vendendo acima de 100 mil cópias sem ter anime (Kimetsu no Yaiba vendia 157 mil cópias e Jujutsu Kaisen vendia 247 mil cópias), atualmente a questão é completamente diferente. Se levarmos em consideração que existe uma possibilidade do Ranking Oricon estar sobra-estimento os números do mercado (como comentei na minha análise sobre distorções do Ranking Oricon), o número de mangás que vendem abaixo de 100 mil cópias físicas nas primeiras revistas Shonen é ainda menor.
Contudo, sabemos que por exemplo em 2022 aproximadamente 35% das vendas da Weekly Shonen Jump foram digitais. E eu tinha calculado que tem a possibilidade de 20 a 25% das vendas de Sakamoto Days serem digitais também. Não sabemos ao certo quanto os mangás vendem digitalmente, mas existe sim uma migração em parte do público ao mercado digital, que não vem contabilizado no Ranking Oricon. Nenhum desses mangás vende somente aquela quantidade na tabela, todos vendem mais, só que não sabemos quanto mais.
Também é importante avaliar o período histórico e os gostos da população japonesa. Na questão do período histórico, estamos vendo um envelhecimento da população, assim uma diminuição do público comprador de mangás Shonen, resultando em um natural queda em vendas. Além disso, existem períodos que o público prefere comprar as revistas, mas não os volumes (ano 80 e 90), e outros períodos no qual as compras dos volumes estavam em alta.
Se somarmos as vendas digitais e físicas da Shonen Jump em 2022, ela vendeu 2 milhões de unidades (700 mil digitalmente e 1.3 milhões fisicamente), a mesma quantidade de 2016. Deste modo a revista mesmo tendo uma Line-Up com poucas séries com anime – e mesmo com o envelhecimento da população -, a Shonen Jump consegue vender a mesma quantidade que vendia em 2016, provando que o público japonês ainda está interessado em comprar a revista. É possível (repito que é uma possibilidade, não é uma certeza) que o público japonês esteja voltando a consumir as séries semanalmente, através dos aplicativos e das assinaturas digitais das revistas, não sentindo mais a necessidade de comprar os volumes. Se isso estiver acontecendo, o número de pessoas que compram os volumes físicos para ler os capítulos estariam diminuindo, restando somente aqueles que compram para colecionar.
OS MANGÁS SEM ANIME
De fato, quando pegamos as obras das principais revistas shonen sem anime, vemos que o TOP 10 mais vendidos são:
1. Kaiju no.8 (Shonen Jump +)
2. Ruri Dragon (Weekly Shonen Jump)
3. Ao no Hako (Weekly Shonen Jump)
4. Sakamoto Days (Weekly Shonen Jump)
5. Dandadan (Shonen Jump +)
6. Gokurakugai (Jump SQ)
7. Seihantai na Kimi to Boku (Shonen Jump +)
8. Akane Banashi (Weekly Shonen Jump)
9. Witch Watch (Weekly Shonen Jump)
10. Kindergarten Wars (Shonen Jump +)
Vemos uma domininação quase por completa da Shonen Jump, com exceção de Gokurakugai da Jump SQ. É preocupante perceber assim que a Shonen Magazine e a Shonen Sunday não estão conseguindo lançar obras que disputem com o sucesso do departamento da Shonen Jump. Para piorar, nem mesmo a Jump SQ está conseguindo lançar novas obras de sucesso, tendo assim somente dois mangás sem anime que vendem bem: Gokurakugai e Show-ha Shou-tem, sendo o primeiro uma obra muito promissora. Deste modo praticamente o que vemos é um mercado shonen que pode, nos próximos anos, ser dominado por novas obras somente da Weekly Shonen Jump e da Shonen Jump +, criando um monopólio muito perigoso entre essas duas grandes marcas do mesmo departamento.
Obviamente temos algumas obras de outras revistas menores, como Yomi no Tsugai da criadora de Fullmetal Alchemist, que não entram na lista por não estarem nas cinco principais revistas do mercado, contudo essas obras são lançadas em revistas que raramente conseguem ter muitos mangás de sucesso. O público deste modo tende a não comprar a revista, mas sim comprar diretamente os volumes, aumentando as vendas dos volumes, mas quase não mudando as vendas da revista. Mangás em revistas mais populares, como a Weekly Shonen Jump, tem uma grande quantidade de leitores que compram a revista, mas não compram os volumes, já que leram os capítulos através da revista. É por isso que sempre digo que a popularidade dos mangás da Weekly Shonen Jump e da Shonen Jump + é bem maior do que as vendas mostram.
Em síntese, as revistas não citadas na lista podem até lançar mangás de sucesso, que ajudarão na sobrevivência da revista, mas não serão o suficiente para contestar o monopólio da Shonen Jump. Um anime de Yomi no Tsugai irá trazer muito lucro para a Monthly Shonen Gangan, mas não será o suficiente para a Monthly Shonen Gangan criar um capital o suficiente para disputar de igual para igual com a Weekly Shonen Jump.
De qualquer modo, é muito provável que nos próximos anos tenhamos algumas obras se destacando na comunidade shonen: Ao no Hako, Sakamoto Days, Dandadan, Seihantai na Kimi to Boku e Akane Banashi são sim as cinco obras mais promissoras sem anime, com Gokuragakai também se destacando, mas como o autor já está tendo dificuldades em lançar capítulos mensais pode demorar um pouco para ganhar um anime. Esses são os mangás que provavelmente ganharão uma adaptação de alta qualidade e a Shueisha realizará um grande investimento nessas obras.
Já o primeiro colocado Kaiju no.8 é de longe a obra em vendas mais promissora, mas ao mesmo tempo o mangá perdeu 66% dos seus leitores nos últimos 6 volumes, como eu tinha explicado em uma postagem nas nossas redes sociais do Analyse It. Kaiju no.8 chegou a vender quase 1 milhão de cópias sem anime, mas agora vende 341 mil cópias (números surreais ainda). Essa queda aconteceu por causa do rumo da sua história que está desagradando a grande maioria dos seus leitores. Desta maneira, mesmo que o anime tenha um grande sucesso inicial, existe chances reais de Kaiju no.8 perder seus leitores nas temporadas seguintes. Vejo Kaiju no.8 como um grande nome para 2024, mas não para os anos seguintes.
A Weekly Shonen Jump além de ter Ao no Hako, Sakamoto Days e Akane Banashi, obras com grandes chances de se tornarem líderes no mercado, também tem outros nomes promissoras, mangás que vendem bem que podem vir a virar agentes importantes na dinâmicas de vendas, mesmo que não sejam líderes. Witch Watch, por exemplo, tem já o trigésimo oitavo mangá mais bem vendido entre as cinco principais revistas, podendo entrar no TOP 20 após uma boa adaptação. Obras como Kill Blue e Nue no Onmyouji lançadas nesse ano, caso consigam conquistar mais leitores nos próximos dois anos e não terminem canceladas, podem chegar ao momento da sua adaptação com uma comunidade de leitores bem estabelecida, importante a criação do hype e na popularização de uma obra.
Enquanto a Shonen Magazine vai ter que apostar em Seitokai no mo ana wa aru!, que por ser uma comédia romântica tem sérias dificuldades em alcançar um público maior, vendendo assim acima de 100 mil cópias. E terá que encontrar novos mangás. O mesmo vale para a Shonen Sunday que a obra sem anime mais promissora é realmente Mikadono, que atualmente não tem grande potencial para se tornar um líder de mercado. Mas como não todos os estúdios vão poder trabalhar com a Shonen Jump, eu acredito que veremos boas adaptações de obras mais desconhecidas, mais obscuras. Assim a possibilidade de adaptações de revistas como a Shonen Ace ou de Webtoons, podem sim se tornar bastante populares. A maioria das obras de sucesso vão ser da Shonen Jump, mas não acredito que esse TOP 10 será realmente os dez animes shonen mais populares dos próximos três anos.
OBRAS DE 2022 E 2023
Para concluir, gostaria de comentar um conceito também importante. O ano de 2022 e 2023 resultou terrível para TODAS as principais revistas – e mesmo a tabela não mostrando também para as demais revistas menores -. Foram poucos sucessos lançados nesses dois anos. A Weekly Shonen Jump conseguiu encontrar somente quatro que vendem acima de 20 mil cópias: Ruri Dragon, Akane Banashi, Kill Blue e Nue no Onmyouji.
A Jump Plus teve um ano ainda mais decepcionante que a Weekly, encontrando somente dois vendendo acima de 20 mil: Seihantai na Kimi to Boku em 2022 e Kindergarten Wars em 2023. A plataforma que lançou o triplo de mangás que a Weekly Shonen Jump, encontrou menos sucessos. E não é por nada que estamos vendo atualmente uma leva de cancelamentos na plataforma, que está tentando fazer uma limpa geral para compensar a quantidade gigantesca de obras não lucrativas lançadas nos últimos dois anos.
A Jump SQ já vinha de um problema crônico em encontrar novas séries, acabou encontrando somente um mangá que vende acima de 20 mil cópias: Gokurakugai, contudo essa obra devo dizer que pode vir a se tornar um dos principais nomes do mercado nos próximos anos, já que vendeu 63 mil cópias em somente dois volumes. A Shonen Magazine encontrou somente dois mangás também, Gachiakuta e Seikotai no mo ana wa aru!, que precisam ainda convencer para vingarem. E a Sunday realmente encontrou somente Mikadono, que se tornará provavelmente a grande aposta da revista para 2025.
CONCLUSÃO
O mercado está apresentando novos números, mais baixos do que os anteriores. Esperar que uma nova série venda acima de 50 mil cópias é esperar algo que acontece cada vez mais raramente. Atualmente temos somente dois novos mangás entre as cinco principais revistas shonen que conseguiram tais números: Gokurakugai e Akane Banashi. O mundo está mudando e devemos mudar também nossa concepção sobre as vendas.
Os sucessos estrondosos vendem acima de 100 mil cópias, os grandes sucessos vendem acima de 50 mil, e vender acima de 20 mil cópias demonstra que também a obra é um bom sucesso comercial, mesmo não seja nada de espetacular. Eu realmente acredito, vendo o número de pessoas que compram a Weekly Shonen Jump e o número de pessoas que baixam os aplicativos de leitura de mangás, que temos sim entre 25% e 35% dos leitores comprando mangás digitalmente – e temos uma outra grande quantidade de leitores que compram as revistas, leem os capítulos online, mas não compram os volumes, já que não veem a necessidade. Esse é o novo normal e temos que nos adaptar a ele.
Mas o que mais me preocupa em tudo isso não é mesmo a queda em vendas, já que vemos mais como uma mudança na dinâmica do mercado shonen do que realmente uma grande crise (artigo que ainda quero escrever sobre, mas deixarei para quando eu tiver mais tempo). O que eu vejo é um crescimento do monopólio da Shonen Jump em comparação as demais revistas shonen. É preocupante quando pegamos as 5 principais revistas-plataformas shonen, e vemos que o TOP 10 mangás sem anime que melhor vendem vem justamente do departamento da Shonen Jump.
É muito preocupante.