O novo mangá de romance da Weekly Shonen Jump, mesmo tendo pouquíssimos capítulos, já está dando o que falar. Com uma boa estreia na visão do público e com a sua sobrevivência garantida, chegou o momento de comentarmos sobre a série. Será que esse novo mangá é realmente bom?
Nessa crítica irei destrinchar os primeiros dezesseis capítulos da série, deste modo, os capítulos referentes aos dois primeiros volumes. Lembrando que essa é uma crítica que contém claros spoilers sobre o que está acontecendo na série, assim sendo, caso você ainda não tenha lido Ao no Hako, saiba que está assumindo um risco.
Crítica
Enquanto para muitos leitores casuais, o que define a qualidade de uma série são seus primeiros volumes, para o público da Shonen Jump, o que define a qualidade de uma série, por isso a possibilidade de sobrevivência é definida pela conexão do público com os primeiros capítulos, sendo mais específico, os sete primeiros capítulos. É muito raro que uma série que tem seus primeiros cinco capítulos odiados, consiga ser sucesso.
Até mesmo os mangás que consideramos os primeiros capítulos “mais lentos” e “chatos”, foram bem recepcionados: Kimetsu no Yaiba, One Piece e SKET Dance, são exemplos de mangás que muitos leitores dizem que se deve superar “o primeiro arco” para chegar na parte boa. A realidade é que todos esses mangás tiveram uma boa recepção já no primeiro arco – no caso de ONE PIECE, a recepção não foi só boa, mas ESPETACULAR -.
A autora de Ao no Hako, Miura Kouji, mesmo tendo uma pressão enorme nas costas, decidiu adotar um ritmo um pouco mais lento do habitual para a revista. Apresentando somente uma partida rápida de Badminton nos primeiros dois volumes, a autora utiliza os dezesseis primeiros capítulos para desenvolver bem o psicológico de Taika Inomata, e para desenvolver a personalidades de três personagens secundários: Taiki Inomata, Chinatsu Kano, Hina Chono e Kengo Haryu. Também temos Kyo Kasahara, porém, o personagem não tem um real desenvolvimento: Serve somente como um conselheiro genérico.
A estrela, independente da temática do capítulo, acaba sempre sendo o amor de Taika por Chinatsu. TODOS os capítulos são focados em como Taika Inomata está treinando duramente para ser tornar digno de ser amado pela Chinatsu. Até mesmo o esporte, Badminton, se torna um elemento secundário na história. Temos rivais, mas as partidas são rapidíssimas. Essa não é uma história puramente de esporte, mas um misto com romance, por isso, se não tivermos uma grande revolução na sua narrativa, o mangá nunca se tornará um Haikyuu!!, um Slam Dunk.
E devo dizer que a autora, mesmo não desenvolvendo de modo claro a personalidade de Chinatsu Kano, consegue de modo eficaz apresentar e explanar bem o protagonista da história, Taika Inamota. Nesses dois primeiros volumes, entendemos muito bem as suas motivações, o seu sentimento de inferioridade e nos simpatizamos pelo seu desejo em melhorar. Talvez sua obsessão por Chinatsu pode soar excessiva em alguns momentos, contudo, no contexto da série (um romance shounen, que tendencialmente é exagerado), se torna aceitável.
Chinatsu Kano, para dar uma sensação de mistério ao leitor, assume um papel mais “silenciosa” e mais “misteriosa”, assim, como o protagonista, o leitor não consegue muito bem interpretá-la. Deve ir colhendo as suas intenções, nos momentos que propositalmente o autor decide mostrar um pouco da personalidade da personagem. Sim, sabemos que Chinatsu é também interessada por Taika, isso é óbvio, suas ações demonstram, mas na grande maioria dos quadros, não sabemos o que ela está pensando, deste modo não sabemos QUANTO Chinatsu ama o Taika. O lado negativo dessa ação, é que acaba distanciando os leitores da personagem: Do mesmo modo que Chinatsu é intangível para Taika, de certo modo, é também para o leitor.
E isso acaba favorecendo uma maior simpatia por Hina Chono, que além de uma menina muito amável, externa através dos seus pensamentos, o sentimento que prova por Taika. A autora, inclusive, desenvolve outras problemáticas da personagem, como uma possível bulimia, o que a rende ainda mais humana. Não é por nada que tantos leitores atualmente preferem Hina Chono que Chinatsu Kano – Enquanto temos uma personagem (Hina) que diz o que pensa. e demonstrar estar sofrendo por amor, do outro lado temos (Chinatsu) que é sempre silenciosa e não demonstra tanto seus sentimentos.
Talvez o capítulo do aquário, no segundo volume, tenha ajudado os leitores a se conectarem mais com a Chinatsu, já que mostrou um claro interesse na personagem no protagonista – Esse interesse era mostrado de modo mais sútil nos capítulos anteriores – Contudo, a autora no capítulo seguinte mostra literalmente a Hino sofrendo na chuva ao descobrir que Chinatsu vive com Taika. As cenas da Hino tendem sempre a ser mais intensas que as cenas da Chinatsu.
Por isso, essa escolha narrativa (deixar Chinatsu como um elemento mais misterioso e intangível) pode soar correta para o início da história (pois acaba movendo a história), porém, dever ser muito bem cuidada nos próximos volumes. Quanto mais a conexão emocional que os leitores estão criando com Hina Chono for se fortalecendo e intensificando, mais improvável será a sua ruptura quando a autora decide desenvolver de uma vez por todas a Chinatsu. O resultado será uma decepção generalizada quando no desfecho da história, Taika escolher Chinatsu.
Entretanto, não somos certos que Taika terminará a história junto a Chinatsu – Existe uma possibilidade que Taika acabe escolhendo a Hino – Porém se essa surpresa não acontecer, é bem provável que a autora irá seguir a tradicional narrativa, no qual os “amores secundários” acabam encontrando outras pessoas, enquanto o “amor primário” (composto pelos dois protagonistas da história) terminam juntos.
Já Haryu, no primeiro volume, serve mais como um antagonista para Taika – Enquanto Hina e Chinatsu servem como elemento que algema a série ao romance. Haryu serve como elemento que algema a série ao esporte, ao Badminton. E mesmo a autora tentando desenvolver um mistério sobre as intenções de Haryu com Chinatsu, percebemos que sua verdadeira função, é da uma rival no âmbito esportivo para o protagonista. Alguém que deve ser enfrentado.
Porém, no segundo volume o autor modifica um pouco Haryu, quebrando o mistério sobre suas intenções e dando bem mais profundidade a relação. O personagem deixa de ser um rival, para se tornar uma espécie de mentor (que um dia Taika terá que vencer). É alteração que enriquece a obra e deixa a sua narrativa bem mais interessante – O mangá tem como objetivo ser mais realista do que mangás como Nisekoi ou Ichigo 100%, desta forma, é importante que criar relações diversificadas, que não se baseiam somente no romance.
Até agora tivemos somente uma partida intensa (todas as partidas ou treinamenntos foram bem mornos). É inegável a capacidade de desenhar da autora: A sua arte realça principalmente os olhos, o suor e também os cabelos dos personagens. Contudo, ao mesmo tempo, sofre em conseguir dar uma boa sensação de movimento (importante nos mangás de esporte). Os quadros estáticos da autora são espetaculares, quadros que requerem mais movimentos, tendem a ser mais problemáticos. É claramente uma belíssima arte “shoujo” sendo adaptada a uma realidade esportiva.
Todos esses arcos, mesmo sendo funcionais, não são inovadores: Muito pelo contrário, até agora, Ao no Hako, escolheu uma narrativa sensível, porém genérica, sem grandes novidades. O protagonista que tenta lentamente descobrir se a protagonista está apaixonada. Ao mesmo tempo tem uma outra personagem feminina apaixonada pelo protagonista. Tudo isso já foi visto antes. Talvez a maior surpresa em relação aos demais mangás da Shounen Jump, são elementos mais shoujos (por isso a presença de personagens masculinos interessados pelos femininos).
Os dois primeiros volumes, deste modo, não apresentam realmente nada de novo; nem mesmo unir romance com esporte é realmente algo novo. Contudo, Miura Kouji, entrega aquele arroz com feijão, no qual quase todos os personagens relevantes são realmente bem desenvolvidos e a história consegue progredir com calma, sem muitos defeitos. As ótimas cenas dramáticas, os diálogos de qualidade e o bom uso dos personagens secundários acabam temperando bem esse feijão com arroz, deixando-o bem apetitoso.
Nota: 7.0